sábado, 23 de março de 2013

Pedalando com crianças em SP: as dificuldades e as recompensas


Indo pra escola no primeiro dia de aula.

No início do ano mudamos pra perto da ciclovia. O apartamento é bem menor do que a casa que morávamos, mas a idéia é usar a cidade como quintal, e a ciclovia como via de deslocamento.
Desde então passei a levar meu filho duas vezes por semana na escola de bicicleta.
São 7 km de distância. Vamos pela ciclovia, atravessamos a ponte e depois seguimos pela calçada.

Pra atravessar a ponte, meu filho quer morrer de vergonha. Coloco a bicicleta no meio da pista até que todos os carros parem e sinalizo para que ele atravesse em segurança. Vou fazendo sua escolta até conseguirmos. Sim, é uma gincana mesmo.

Vídeo sobre a dificuldade de atravessar as ruas,
principalmente pra acessar as pontes em SP.

Depois os problemas são os carros e caminhões estacionados nas calçadas, que as vezes nos obrigam a usar a rua. Outra gincana.

A ciclovia ainda não foi sinalizada e tem muitos defeitos na sua execução, como os rebaixamentos das guias em lugares errados, fazendo com que o ciclista tenha que pegar a pista da esquerda da rua pra conseguir atravessar. Tudo pra caber mais um carro aguardando o semáforo abrir. Os carros invadem a faixa de segurança, não deixando espaço para uma travessia segura. Outra parte crítica do trajeto.

Carros aguardam o sinal invadindo a faixa de segurança,
dificultando a travessia de pedestres e ciclistas



As recompensas?

"Mãe, acho que essa árvore cresceu, você não bate mais o capacete no galho quando passamos aqui..."
"Mãe, imagina se esse rio fosse limpo? A cidade ia ser de outro jeito, né?"
Ou as paradas que fazemos pra comer um lanchinho na volta pra casa.
Momentos de troca como esse fazem do nosso deslocamento a parte mais divertida do nosso dia.
Mas confesso que não é uma tarefa fácil.

Dia de chuva.

Comendo ameixa na volta da escola.


Desde o atropelamento da Julie, em março de 2012, meu filho me pergunta TODOS OS DIAS onde eu vou, que horas eu volto e que caminho eu vou fazer. E ai de mim se não atendo o celular. Motivo de desespero. Outro dia ele me disse que estava super angustiado e não me falava o motivo. Perguntei: "Filho, você está com medo que a mamãe seja atropelada no caminho?". " É isso, mãe!" Respondeu ele, aliviado.
Desde domingo, 10 de março, quando David dos Santos foi atropelado na Av.Paulista, ele não quis mais ir de bicicleta pra escola. Vai na minha garupa, agarrado em mim, até metade do caminho, onde pega uma carona com a mãe de dois amigos.

Com medo de andar de bicicleta, agora vai na minha garupa
até a metade do caminho, onde pega uma carona.


Compreensível. Imagino o que se passa pela cabeça de uma criança de nove anos, diante desses acontecimentos.

Tento explicar pra ele que nada vai me acontecer, mas como dar essa garantia? Pedalando pela Av.Paulista, onde os ônibus ( principalmente os da linha verde 917H) nos pressionam, mesmo olhando nos olhos dos motoristas e sinalizando que no próximo quarteirão vamos sair da frente? Pedalando numa ciclovia onde a avenida permite 60km/h como velocidade máxima para os carros? Não, infelizmente não tenho como garantir.

Espero que essa conversa com nosso prefeito tenha rendido bons frutos, que esse plano das zonas 30 funcione, que a lei seca seja realmente aplicada e que a cidade comece uma grande transformação, para que todos nós consigamos transitar com segurança, cada um no veículo que escolheu.

E que um objeto tão prazeroso, tão sustentável e tão transformador, parte da solução para os problemas das grandes ( e pequenas) cidades, não seja a causa de tanta preocupação e tanta tragédia.